Nova Proposta de Classificação da Obesidade baseada no histórico de peso: uma nova ferramenta no tratamento da doença?

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Daniela Kamel

Médica endocrinologista – CRM PE 23.691    | RQE 12.394

Membro titular da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia

 

A obesidade é uma doença crônica muito estigmatizada, que está associada a várias comorbidades e redução da expectativa de vida, com um impacto importante na qualidade de vida e saúde mental. A maior dificuldade no tratamento é a manutenção do peso perdido, gerando muita frustração para o paciente e abandono do tratamento.

Até hoje, a maior parte das pessoas ainda acredita que o objetivo do tratamento da obesidade seja normalizar, por assim dizer, o índice de massa corporal (IMC), como se só assim, tornando-se “magro”, fosse possível obter benefícios clínicos e ter um organismo mais saudável.

Porém, não é isso que vemos nos estudos clínicos.  Perdas de peso modestas, geralmente a partir de 5% do peso inicial, já mostram melhoras metabólicas importantes, como melhora do colesterol HDL, depressão, resistência insulínica e função sexual. Perdas maiores de 10-15% do peso mostram benefícios metabólicos ainda melhores, além de melhora da esteato-hepatite e de doenças cardiovasculares, independente do IMC inicial. No estudo DiRECT, por exemplo, perdas de 10 e 15kg foram associadas com remissão de diabetes em 57 e 86% dos pacientes, respectivamente.

Até então, a maioria dos guidelines foca em perdas de pelo menos 5-10% do peso, geralmente recomendando maiores perdas de peso no seguimento, visto o IMC ainda estar elevado e esses pacientes ainda serem considerados de “alto risco” para comorbidades. Porém, resolução a obesidade é raramente alcançada com o tratamento clínico, visto sua complexa fisiopatologia, na qual perdas de peso são contrabalanceadas por redução do gasto energético e aumento da fome mediada pelo centro hipotalâmico, levando na maioria das vezes ao reganho do peso perdido. O tratamento, até então, continua sendo focado em perdas maiores de peso e não na manutenção do peso já perdido, geralmente ocasionando reganho de peso e o famoso “efeito sanfona”.

Sendo assim, a Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e Síndrome Metabólica (ABESO) e a Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (SBEM) lançaram em 2022 uma nova proposta de classificação para a obesidade baseada no maior peso da vida e na porcentagem de peso perdida com o tratamento, em uma tentativa de ampliar o acompanhamento para além apenas do valor do IMC e focar nos benefícios possíveis com perdas de peso relativamente “pequenas”, a partir de 5%.

A nova classificação sugerida nessa proposta seria para pacientes entre 18 e 65 anos, com IMC entre 30 e 50, e seria calculada a perda percentual de peso baseada no maior peso da vida, criando o conceito de obesidade reduzida e controlada, a depender do IMC inicial.

A nova proposta seria:

IMC inicial 30-40:

– Obesidade reduzida – perda de 5-10% do maior peso da vida

– Obesidade controlada – perda > 10% do maior peso da vida

 

IMC > 40:

– Obesidade reduzida – perda de 10-15% do maior peso da vida

– Obesidade controlada – perda > 15% do maior peso da vida

A proposta da nova classificação não tem o objetivo de substituir outras classificações, mas sim de valorizar um emagrecimento mais sustentável, focando na manutenção da perda de peso que já traz grandes benefícios à saúde. Afinal, é a manutenção da perda de peso o maior desafio no tratamento da obesidade. Mais estudos precisam ser realizados para adoção dessa classificação, mas traz um alerta para a necessidade de abordar o paciente obeso que emagreceu com uma visão mais realística.