Erik Trovão Diniz, endocrinologista, CRM 15491
Supervisor do Programa de Residência Médica em Endocrinologia e Metabologia do Hospital das Clínicas / UFPE
A transexualidade, não mais considerada transtorno pela psiquiatria, é uma condição em que a identidade de gênero de um indivíduo é incompatível com o seu sexo biológico, trazendo a necessidade de intervenções que tentem adequar as características físicas ao gênero com o qual o indivíduo se identifica. Entre estas intervenções, destaca-se o uso de hormônios e, portanto, o endocrinologista tem papel fundamental na assistência à saúde desta população.
Nos homens trans (pessoas do sexo biológico feminino, mas com identidade de gênero masculina), deve-se repor testosterona, utilizando-se formulações e doses semelhantes às empregadas para o tratamento do hipogonadismo masculino. O seguimento deve incluir a dosagem do hematócrito e do perfil lipídico e a manutenção da testosterona sérica dentro da faixa média da normalidade para o gênero masculino.
Após o início da testosterona, a amenorreia costuma ocorrer nos primeiros seis meses e a virilização completa se estabelece nos dois anos seguintes. Como efeitos adversos, pode ocorrer: acne, alopecia, hipertensão e apneia do sono. Dados relacionados à mortalidade cardiovascular ainda são escassos, mas parecem apontar para a segurança do uso da testosterona, o mesmo se aplicando ao risco de malignidade.
Nas mulheres trans (pessoas do sexo biológico masculino, mas com identidade de gênero feminina), a reposição de estrógeno costuma ser feita com doses habituais maiores do que na mulher cisgênero. O etinilestradiol está contra-indicado, uma vez que estudos mostraram aumento da mortalidade cardiovascular com o seu uso.
Pode-se associar um anti-androgênico (espironolactona ou ciproterona), cuja dose deve ser ajustada de acordo com o efeito na pilificação cutânea e na ereção. Após a orquiectomia (caso seja realizada), seu uso deve ser suspenso.
Em geral, os efeitos estrogênicos máximos ocorrem em até 2 anos, devendo-se estar atento aos efeitos colaterais, em especial, ao risco de tromboembolismo. Dados a respeito do risco de câncer ainda são incertos.
Por fim, vale ressaltar o efeito positivo da reposição hormonal sobre a saúde mental desta população, já que estudos mostraram a redução do risco de suicídio, uma das principais causas de morte entre os indivíduos transgêneros.
Desta forma, cabe a reflexão: até que ponto é ético negar o hormônio aos homens e mulheres trans?